terça-feira, 29 de dezembro de 2009

A NOITE DA GLÓRIA AZUL.

Comandado por um punhado de jovens craques, o Mineirinho de Ouro derrotou o Santos, faturou a Taça Brasil e escreveu o nome do Cruzeiro no mapa da bola.
Eu tinha 19 anos. Foi a época que o Cruzeiro estava despontando, e, com a inauguração do Mineirão no ano anterior, 1965, começávamos também a ganhar títulos, como o bicampeonato mineiro. Sonhávamos, porém, com uma conquista que nos desse maior projeção. E a Taça Brasil era essa grande chance. Já se falava do nosso time no eixo Rio-São Paulo, embora ele não tivesse alcançado ainda o ponto que queríamos, pois o futebol de Minas, na época, era considerado do interior, bem abaixo dos paulistas e cariocas, sem nenhuma chance de chegar a um titulo nacional. Indiferente à descrença geral, nos preocupamos apenas em impor nosso ritmo de jogo naquela Taça Brasil de 1966, uma competição eliminatória, um a um vencemos todos os obstáculos. Equipes consideradas favoritas não resistiram ao nosso futebol. Chegar à grande final já foi uma grande vitória, mas o maior dos desafios ainda estava por vir: para colocarmos as mãos no titulo, teríamos que superar nada menos que o poderoso Santos, então o melhor time do mundo. E eles vinham completos, ou seja: com Pelé, Toninho, Zito, Mengálvio – enfim, com todas suas estrelas. Ninguém acreditava que nós, com uma equipe jovem e, até certo ponto, inexperiente pudéssemos superar aquela equipe maravilhosa, de grande experiência internacional. Na primeira partida da final, no Mineirão, demonstramos que não seriamos presa fácil. Ao contrario: aplicamos uma sonora goleada de 6x2. jogamos muito melhor.
Deu tudo certo. Fiz um gol e viramos o primeiro tempo vencendo por 5x0. essa vitória espetacular deu mais confiança à equipe. Mas sabíamos que em São Paulo seria tudo diferente. Primeiro, porque eles jogariam diante de sua torcida. Segundo, pela tarimba e orgulho ferido dos jogadores santistas, que iriam querer devolver a humilhação de qualquer maneira. Ao entrarmos em campo, meu coração batia forte. O grande números de cruzeirenses presentes nos deu mais força. Aconteceu o que prevíamos: eles vieram com tudo pra cima da gente, procurando matar o jogo logo no inicio. Mesmo com o campo pesado – tinha chovido à tarde – o Santos apresentava uma correria infernal. O Pelé, então, jogava com uma garra incrível. Nós não sabíamos como sair para o ataque, criar nossas jogadas estávamos perdidos em campo, com a marcação cerrada imposta pelo Santos.
Resultado: perdemos o primeiro tempo por 2x0, um gol do Pelé e outro do Toninho Guerreiro, enquanto voltamos para o vestiário, um pouco assustados, eles mostravam-se superconfiantes. Tanto que a imprensa da época noticiou o assedio de dirigentes santistas sobre os nossos para marcar, ali mesmo, o local do terceiro jogo. Isso tudo durante o intervalo! Alheiros a essa atitude conversamos muito. A certeza que eles se cansariam daquela correria no segundo tempo nos animava. Felizmente, nossas previsões estavam certas. O Santos estava acuado. Tocávamos passes rápidos na frente da área adversária e chegávamos com facilidade ao gol de Cláudio.
Logo no inicio, tive uma boa oportunidade de fazer o primeiro gol. Foi uma bola que eu peguei na esquerda, ganhei na corrida do marcador, mas perdi o ângulo na hora de chutar.
Nosso domínio era total. Aos quinze minutos, a grande chance. O Dirceu Lopes entrou driblando pela grande área santista e sofreu pênalti. Eu, que era o batedor oficial de falta da equipe, me apresentei. Só que bati mal, e perdi a cobrança. Sempre fui um jogador que gostava das adversidades. Quando estava em um momento ruim do jogo, aí é que eu me superava. Na hora, fui tomado pela fúria. Tinha que corrigir meu erro, tinha que partir para cima, jogar tudo. Comecei a correr mais ainda, e desnortear meus marcadores. As chances continuavam aparecendo. O Santos estava morto em campo.
E veio a consagração. Em falta, bem próxima da lateral, do lado direito do nosso ataque, me deu uma vontade súbita de bater direto para o gol. Na hora, o Natal, que jogava na ponta direita, pediu para eu fazer o cruzamento, pois não tinha ângulo. Mas insisti, e meti a bola a meia altura, no lado esquerdo. O pênalti já tinha ficado para trás. A comemoração foi enorme. O time cresceu mais ainda em campo. O segundo gol, a partir daí, era só questão de tempo. Empatamos em uma jogada individual de Dirceu, que entrou driblando pela área e tocou na saída do goleiro, era o gol do titulo. O incrível é que, após o empate, em vez deles nos pressionarei, nós é que continuamos no ataque. O Santos não esboçava a menor reação. O terceiro gol, o da virada histórica, veio fechar com chave de oura nossa campanha. O Hilton Oliveira ia bater o escanteio. Corri para perto e puxei a marcação adversária. Ele, ele, tocou curto, na minha direção. Dei a volta e entrei driblando pelo lado esquerdo da área. Quando cheguei perto do gol, percebi o Natal livre, na marca do pênalti, e toquei para ele, que só escorou, de primeira. A bola entrou no canto direito do gol. Uma alegria indescritível. Éramos os campeões brasileiros, com duas vitórias sobre o melhor time do mundo.

Fonte: Revista Placar.

0 comentários: